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sexta-feira, março 07, 2008

Eu Acuso


É uma proposta de reflexão sobre os grandes Media nestes tempos de globalização.
Uma carta aberta, dirigida por Manuel Vazquez Montalbán a Bill Clinton, publicada no Le Nouvel Observateur (Janeiro de 1998) e também no El País (30-03-1998) . Lida, posteriormente, em Lisboa, pelo escritor, na Fundação Gulbenkian.

"Senhor presidente, quando se assume a ética e a estética da democracia, o Estado, quer dizer, o Grande Inquisidor, tem que ser avaliado democraticamente. Na aldeia global, o Grande Inquisidor garante a ordem nacional, meteorológica, internacional, europeia, social, interpessoal, sexual, gastronómica, ecológica sempre a partir do consenso, por mínimo que seja e, na sua imperfeição, com a ajuda dos Boinas Azuis. Todo procedimento é bom para a imposição do referente privilegiado e de uma ordem que o senhor nos vende como indispensável para nossa sobrevivência e necessidades.
O instrumento fundamental para a imposição consensual do Grande Inquisidor leva-o ao Grande Irmão desenhado por Orwell e, perdoe, senhor presidente, que eu recorra a imaginários literários sabendo que ao senhor só interessa o footing e essa insuportável dança chamada Macarena. Por isso, se o senhor não sabe, o Grande Irmão é o poder comunicacional que através da concentração e uniformidade está em condições de impor o consenso impedindo a existência de mensagens alternativas. Actualmente, toda mensagem alternativa parece desestabilizadora, culpada, grosseira a partir da perspectiva do mercado totalitário onde os mais variados suportes estão ocupados com o mesmo conteúdo. Abramos o que abramos sempre aparece um comunicador da CNN ou seu clone, produzidos pela engenharia genética do politicamente correcto. A CNN representa o espírito e a intenção do Grande Irmão que Orwell imaginou em condições antidemocráticas, porém plenamente desenvolvido no monopólio democrático que o senhor dirige como o Grande Inquisidor do Império do Bem. À direita do trono, a CNN com sua informação pasteurizada, oferecendo uma decoração potemkiniana do mundo, essa fachada global de Grande Hotel de cinco estrelas que esconde os novos condenados da Terra, para tranquilidade do cliente do hotel, o Grande Consumidor.
Eu acuso a CNN de ser o aferidor da verdade única do Grande Inquisidor. Eu a acuso de ser o Grande Irmão que viria do Este que, porém, chegou do Oeste a serviço do referente de um improvável sujeito histórico de mudança global: o Grande Consumidor, o terceiro membro da Santíssima Trindade, possivelmente o Espírito Santo de todos os Grandes Armazéns deste mundo. A CNN apoia-se num código linguístico de hotel cinco estrelas, sem cafeína, sem álcool, sem fumadores, com preservativo na língua, com um sistema único de sinais…"


Pode ouvir aqui.


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